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Resenha de livro: O oceano no fim do caminho, de Neil Gaiman



“As memórias de infância às vezes são encobertas e obscurecidas pelo o que vem depois, como brinquedos antigos, esquecidos no fundo do armário abarrotado de um adulto, mas nunca se perdem por completo.”

Com um enredo cheio de mistério, O oceano no fim do caminho é narrado por um homem que, ao se deparar com a casa que morou na infância, busca nas profundezas de sua mente as memórias de uma fase turbulenta em sua vida.

Suas lembranças, que há muito não vinham à tona, afloram ainda mais quando se depara com uma fazenda no fim da rua. Ele entra na propriedade e senta-se na beira do lago que existe no fundo da casa. Três mulheres misteriosas, as Hempstock, moravam no local e se referiam ao lago como “oceano”.

Nosso protagonista, que não tem o nome revelado, passa a se lembrar do terror que viveu aos sete anos de idade, quando uma crise financeira em sua família os obrigou a alugar um quarto (o seu, no caso) para um senhor sul-africano. Esse senhor cometeu suicídio dentro do carro da família, e a partir daí, coisas terríveis e inimagináveis dão início na vida do jovem.

Se você não conhece a obra de Neil Gaiman, O oceano no fim do caminho é uma bela porta de entrada, pois o autor derrama toda a essência que o consagrou como um dos melhores e mais versáteis escritores de todos os tempos.

O livro, diferente do que pode parecer à primeira vista, não é infantil. Longe disso. A obra é carregada de mistério e terror, elementos recorrentes nas obras de Gaiman. Com maestria, o autor conseguiu misturar em pouco mais de 200 páginas literatura fantástica, fábula e crônicas.

Um fato muito curioso sobre o livro é que nos agradecimentos, Gaiman agradece principalmente a família Hempstock, o que nos faz acreditar que o livro é autobiográfico. Além disso, a introspecção e o gosto por obras de C.S. Lewis e Lewis Carroll são características do autor.

Para entender a fundo a mensagem do livro, precisamos compreender suas analogias, como no caso da personagem Úrsula, que no decorrer da história representa os pesadelos que temos quando criança. Ela encarna no corpo de uma “boa moça” e entra na casa do garoto. Assim, ela passa a representar o medo que todo jovem tem de ver sua família ruir com uma separação.

Gaiman consegue explorar muito bem a fuga da realidade de uma criança. Ele nos envolve em um universo paralelo e surreal que só um garoto de sete anos poderia imaginar. A cada virar de página eu me impressionava mais, pois ele transforma coisas corriqueiras da infância em acontecimentos extraordinários, exatamente como acontece na cabeça de uma criança no auge de sua criatividade. A narração em primeira pessoa aumenta ainda mais o suspense e a adrenalina, o que nos ajuda a entrar no clima e nos tornar mais sensíveis aos acontecimentos.


Texto publicado originalmente por mim no blog do iba, no dia 08 de abril de 2014.